Natureza

A tragédia gaúcha e a arte de cegar

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A tragédia gaúcha que aconteceu nos últimos dias levantou muitas questões e nos faz pensar sobre o que não estamos enxergando.

Raymond Pierrehumbert, em 2018, enfatizou a urgência de encarar a crise climática sem rodeios. Seu alerta, respaldado pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), destaca a real ameaça que enfrentamos, com consequências preocupantes.

Apesar de alguns minimizarem o problema, a ciência há tempos fala sobre o aumento do aquecimento global, causado por fatores como emissões de gases, degelo do permafrost, acidificação dos oceanos e desmatamento.

As projeções científicas sobre o futuro da civilização na Terra são cada vez mais pessimistas.

Após um ciclone extratropical devastador no Rio Grande do Sul, enchentes ainda mais graves assolam a região. Especialistas alertam que essa é a nova realidade global devido às mudanças climáticas, uma situação que exige atenção urgente.

A emergência climática está finalmente despertando preocupação entre formadores de opinião no Brasil, além de causar distúrbios em pessoas sensíveis às tragédias climáticas e que reconhecem a importância de enfrentar essa crise.

Qual a causa do problema?

Via Globo

Muitos identificam o aquecimento global como a causa primária da emergência climática, inclusive da tragédia gaúcha. No entanto, isso apenas arranha a superfície do problema.

A verdadeira raiz está na disjunção crescente entre o modo de produção capitalista e o Sistema Terra. O capitalismo, impulsionado pela busca de lucro e crescimento incessante, explora um planeta finito, levando a eventos climáticos extremos como secas, enchentes e ciclones.

Em última análise, a resposta está na lógica expansiva do capitalismo em um mundo com recursos limitados.

Desde os anos 1950, as transformações socioeconômicas têm se acelerado rapidamente, impulsionadas pelo capitalismo. O crescimento demográfico explosivo, especialmente nas áreas urbanas, aumentou a fratura metabólica entre a humanidade e a natureza.

Isso resultou em um uso significativamente maior de fertilizantes e um aumento exponencial na quantidade de veículos automotores, levando a uma escalada nas emissões de CO² e NO², gases do efeito estufa.

A partir de 1950, a humanidade se tornou uma força geológica global devido à grande aceleração das atividades humanas. O sistema capitalista alcançou seu auge do pós-Segunda Guerra até meados dos anos 1970, impulsionado por arranjos sociais-democratas que redistribuíam ganhos de produtividade e garantiam renda, demanda e lucros crescentes.

Esse modelo, junto com a reconstrução pós-guerra na Europa, gerou três décadas de crescimento econômico acelerado. Embora essa fase tenha sido interrompida pelos anos 1980 conservadores, a utilização maciça de combustíveis fósseis e a degradação ambiental não foram revertidas.

Humanos

As tragédias como a que assola o Rio Grande do Sul são mais causadas pela ação humana do que pela natureza. A busca incessante por lucro e um estilo de vida voltado ao consumo exacerbado impulsionam o neoextrativismo, mesmo que isso resulte em danos ambientais graves.

O capitalismo, com sua lógica de acumulação de capital, acelera o processo de produção e consumo, levando a uma crescente degradação ambiental. Isso se evidencia pela rápida elevação do nível do mar e pelas projeções alarmantes de inundações costeiras.

A acumulação capitalista não consegue se harmonizar com a biosfera, levando a um desequilíbrio entre a velocidade de consumo de recursos e a capacidade de regeneração do ambiente. Esse descompasso ameaça os ecossistemas e suas funções essenciais, como a regulação do clima e do ciclo da água.

O que fazer?

Via Agência Brasil

Para evitar futuras complicações ambientais, como a tragédia gaúcha, é crucial reconhecer que os seres humanos são parte da natureza, e não seus senhores.

A Terra não é apenas uma fonte de recursos, mas uma rede de ecossistemas essenciais para a vida humana. É necessário romper com o sistema que prioriza a acumulação de capital sobre a preservação da vida, que tem levado a tragédias como a vista no Rio Grande do Sul.

Isso implica uma mudança fundamental na maneira como concebemos a civilização, colocando a vida acima da acumulação de riqueza.

Críticas ao enfoque do IPCC, que muitas vezes prioriza o crescimento econômico em vez de soluções mais profundas, ressaltam a importância de não se basear exclusivamente no mercado como solução para a emergência climática. É preciso buscar uma abordagem que enfrente a raiz do problema.

Infelizmente, não é surpreendente que o IPCC tenha influência da política econômica das grandes corporações transnacionais, como observado por John Bellamy Foster.

Essas corporações se tornaram o centro de um mundo desigual, onde a globalização esconde o imperialismo e a busca desenfreada por lucros causa devastação.

Enquanto escrevo, milhares de gaúchos enfrentam as consequências de enchentes, uma realidade compartilhada por milhões de refugiados ambientais em todo o mundo, vítimas da emergência climática.

Para sair desse labirinto, é essencial reconhecer a desigualdade e a degradação ambiental resultantes do sistema baseado na acumulação de capital.

Este sistema brutaliza e aliena os seres humanos, afastando sua essência criativa. É uma ideologia que afeta a todos, mas só percebemos quando confrontamos a lógica.

 

Fonte: Outras Palavras

Imagens: Globo, Agência Brasil

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