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Psicodélicos estão sendo utilizados no Brasil para aliviar o medo da morte em doenças graves

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O uso de psicodélicos no enfrentamento de doenças graves está ganhando cada vez mais popularidade no Brasil.

Nos últimos anos cresceu o número de estudos científicos sobre substâncias como a psilocibina encontrada em cogumelos, o DMT da ayahuasca e o anestésico cetamina.

As descobertas apontam que essas substâncias podem aplacar sintomas de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático, o que vem entusiasmado as comunidades científica e médica.

Com exceção da cetamina, as substâncias acima pertencem à lista F2, das consideradas ilícitas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com penas previstas na Lei Nacional de Drogas.

No entanto, a ayahuasca é autorizada para uso religioso, segundo resolução do Conselho Nacional de Política sobre Drogas.

Psicodélicos e o tratamento para doenças graves

Foto: Reprodução/ CNN

A possibilidade do uso dos psicodélicos está interessando diferentes campos da Medicina. Um deles é o dos cuidados paliativos, que ampara portadores de doenças graves.

De acordo com Ana Cláudia Mesquita Garcia, enfermeira paliativista e professora na Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas, em Minas Gerais, a ideia dos cuidados paliativos serem voltados apenas para pacientes em fim de vida já foi modificada.

“A última definição da International Association for Hospice and Palliative Care [entidade mundial da área] cita sofrimentos relacionados à saúde, em especial aqueles no fim da vida. Mas, de forma geral, foca no bem-estar de pacientes de doenças graves e também de seus familiares e cuidadores”, disse à BBC.

Milena dos Reis Bezerra de Souza, clínica-geral da equipe de cuidados paliativos do hospital AC Camargo Cancer Center, acrescenta que a contribuição do profissional “é para o alívio do sofrimento”. 

A profissional da saúde começou a investigar o potencial dos psicodélicos a partir da sugestão de seus pacientes.

“É como ser desafiada. A primeira coisa que fiz foi jogar de uma forma muito aberta. Disse: ‘não conheço o assunto, mas eu vou te ouvir, vou estudar’. Primeiro, quero saber se não te prejudica. Depois, a gente define se pode ajudar no tratamento.”

Apesar de não promover as sessões, ele auxilia os pacientes com câncer que desejam passar pela experiência a adequar seu tratamento.

Ayahuasca

Foto: Getty Images

Já Ana Garcia ficou intrigada com a possibilidade dos alucinógenos na sua área após ser convidada a avaliar um trabalho de conclusão de curso (TCC). No entanto, por falta de experiência decidiu recusar o convite.

Mas começou a buscar informações sobre o tema e encontrou a tese de doutorado de Lucas de Oliveira Maia, pesquisador no Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e na Cooperação Interdisciplinar para Pesquisa e Divulgação da Ayahuasca da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo.

A pesquisa de Maia apontou uma relação entre os cuidados paliativos com a ayahuasca, que é feita da mistura do cipó mariri com as folhas de outra planta, a chacrona.

A bebida contém o alucinógeno N,N-dimetiltriptamina (DMT), um alcaloide que possui uma mistura química semelhante à da seteronina.

A Anvisa proíbe o uso do DMT no Brasil. No entanto, uma resolução do Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas (Conad) “prevê exceção para utilização deste tipo de produto (chá) em rituais religiosos”.

O estudo de Maia concluía que os componentes químicos da mistura ajudavam na “aceitação da doença por meio de mecanismos psicológicos múltiplos, incluindo introspecção, autoanálise, processamento emocional e catarse, evocação de memórias autobiográficas”.

Necessidade de estudos e riscos existentes com o uso de psicodélico

Foto: Getty Images

Maia e a enfermeira paliativista Ana Garcia fizeram uma revisão científica de 20 estudos sobre os benefícios de psicodélicos para portadores de doenças graves.

A conclusão da análise, publicada no periódico científico Journal of Pain and Symptom Management, aponta “efeitos positivos” das terapias psicodélicas com “considerável segurança de uso”.

Além disso, em ambiente com monitoramento médico, não foram relatados “efeitos adversos sérios” e, quando presentes, eram de “leves a moderados em intensidade e transitórios”.

No entanto, os pesquisadores destacam que é necessário mais estudos sobre a associação dessas substâncias com esquizofrenia e outras psicoses.

Vale destacar que pesquisadores da universidade norte-americana Johns Hopkins também fizeram uma revisão de estudos no fim de 2021, focada apenas em quadros terminais, e consideraram positiva a incorporação de psicodélicos aos cuidados paliativos.

Porém, eles apontaram que é preciso estudar melhor a aplicação nessa fase, para evitar que a qualidade de vida do paciente piore. Além disso, eles apontaram que é necessário mais informações sobre a associação de psicodélicos com medicamentos.

Por fim, foi apontado que a popularização dessas terapias pode levar a “igualar tratamentos psicodélicos a tratamentos sem base em evidências [científicas] e tratamentos alternativos nesse contexto”.

Cetamina no hospital

Henrique Ribeiro, psiquiatra que faz a ponte entre sua área e a de cuidados paliativos no Hospital das Clínicas de São Paulo, considera-se um entusiasta das possibilidades dos alucinógenos, mas aponta que segue as regras.

O profissional defende que terapias do tipo tenham rigor na triagem de pacientes elegíveis, uma preparação para que a pessoa se sinta segura e que a experiência seja em ambiente hospitalar, com monitoramento.

Já Ana Garcia aponta que é necessário mais pesquisas sobre o assunto. “Psicodélicos têm indicações específicas e não são indicadas para todos, além do fato de não serem uma solução mágica que resolverá todo e qualquer problema.”

Ribeiro faz infusões de um anestésico hospitalar de manejo autorizado: a cetamina (também chamado de ketamina). De acordo com a Anvisa, é uma substância de uso controlado pela portaria 344/1998. Há “usos irregulares/recreativos como droga de abuso de tal substância em âmbito internacional”.

Ele conta que, em ambiente clínico, “é utilizada como uma medicação de benefícios em cuidados paliativos por ter ótimo efeito analgésico e indicação formal para síndromes dolorosas. Na psiquiatria, é útil para tratar depressão refratária. Tenho a experiência de utilizar ketamina em pacientes oncológicos com a finalidade de melhorar os sintomas de humor depressivo”.

No entanto, ele enfatiza que este tratamento ainda está em fase inicial.

Fonte: BBC

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