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Autores alertam para a tirania da felicidade, do prazer e do pensamento positivo

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Geralmente, todo mundo busca a felicidade, seja através de hábitos,  atividades de lazer, ou até mesmo através do trabalho. E por mais que a compreensão de felicidade seja particular, alguns acontecimentos podem afetá-la de maneira geral, como por exemplo, a crise econômica, ou uma demissão.

No filme “Amor sem escalas”, a demissão é rapidamente convertida na oportunidade de buscar os próprios sonhos de acordo com a orientação dada pelo personagem de George Clooney, que viaja pelo mundo para demitir pessoas.

Algumas técnicas como essa “se tornaram úteis no mundo corporativo contemporâneo ao transferir o ônus da responsabilidade sobre a empresa para os assalariados e administrar estes em termos de sua felicidade pessoal”, escreveram o psicólogo espanhol Edgar Cabanas e a socióloga marroquina Eva Illouz no livro “Happycracia: fabricando cidadãos felizes”.

Cuidado com a felicidade

Canal da utopia

Em seu livro, os autores andam por rastros de perdas e mal-estar deixados por esse discurso que estabelece a felicidade individual como meta suprema de vida, além de destacarem os efeitos colaterais que isso pode ter tanto no âmbito pessoal, profissional e social das pessoas.

No mercado de trabalho, por exemplo, a felicidade, que antes era o objetivo a ser alcançado através do trabalho, se tornou um requisito para a contratação, manutenção e promoção do cargo. Isso porque, “assalariados felizes representam a garantia de que trabalharão ao máximo, continuarão motivados, sentirão prazer pelo que fazem e aumentarão a produtividade”, exemplificaram os autores.

Ainda mais com a promoção de atitudes como a resiliência e a autogestão, ficaria a cargo dos próprios funcionários os custos psicológicos das fragilidades e instabilidades de uma empresa.

Com isso, não importa se as condições de trabalho são precárias ou exaustivas. O ponto transmitido é que com mais empenho, resiliência e positividade ele pode mudar sua realidade e ver o seu copo cheio. Em contrapartida, o copo vazio mostra problemas como burnout, que é o esgotamento físico e mental por conta da atividade profissional, e adoecimentos psíquicos, como a depressão.

Influência

BBC

De acordo com Illouz e Cabanas, a influência da felicidade no ambiente corporativo não aconteceu por acaso. Ela também é encontrada nas gestões governamentais, mais ainda nas adeptas ao neoliberalismo.

Ela se deriva do impacto que a psicologia positiva, apresentada nos anos 2000 em um manifesto do psicólogo, e então presidente da Associação Americana de Psicologia Martin Seligman. Ele tinha o objetivo de difundir uma ciência focada nas emoções positivas e na autodeterminação como caminho para a felicidade.

Os autores dizem que essa proposta foi aceita não apenas por acadêmicos, mas também pela imprensa, formadores de opinião, pelo grande público e economistas e políticos. Esses últimos dois grupos viram na felicidade a chave para mensurar o sucesso de uma sociedade.

Então, criou-se uma metodologia para quantificar critérios subjetivos como bem-estar, equilíbrio e prazer. Além disso, índices de felicidade passaram a dar o norte para políticas públicas em vários países.

“Não há nada de errado em buscar a felicidade. É de fato um direito fundamental. Os indivíduos têm o direito de definir por si mesmos o que os faz se sentir bem. Estudamos a psicologia positiva, que é uma distorção muito específica da ideia de felicidade, se tornou uma subdisciplina da economia e serve ao propósito de muitos países, democráticos e ditatoriais. Muitos governos estão tentando substituir uma redistribuição justa de recursos pela felicidade. Isso é algo que deve nos preocupar”, pontuou Eva Illouz.

“Se você mensura a felicidade e declara que este é o objetivo da política, acaba considerando melhor ter países profundamente desiguais do que sociedades mais igualitárias, simplesmente porque as pessoas na Índia declararam que são mais felizes do que as pessoas na França”, continuou.

Problemas

Aleteia

Tudo isso visto na prática, como explica a socióloga, faz com que a busca pela satisfação dos cidadãos substitua os princípios de liberdade e justiça.

Por conta disso, os autores alertam que um dos problemas de apresentar a felicidade como o objetivo mais fundamental a ser perseguido na vida é negligenciar valores tão importantes, como igualdade, solidariedade ou justiça.

“Ignora-se completamente o fato de que estes outros valores são necessários para ser feliz. Poucos fatores são tão determinantes para a felicidade quanto a desigualdade, por exemplo. De fato, talvez nenhum outro fator sociológico esteja mais forte e claramente relacionado ao bem-estar e à saúde mental do que a desigualdade. Os dados sobre isso são sólidos e convincentes: as taxas de doença mental são inconfundivelmente mais altas em sociedades com maiores diferenças de renda”, concluíram os pesquisadores.

Fonte: BBC

Imagens: Canal da utopia, BBC, Aleteia

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