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Por que nenhum país da América Latina tem armas nucleares?

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Desde 1945, a humanidade ainda sofre um estresse pós-traumático, após a explosão das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki. Foi o primeiro contato dos homens com as armas nucleares. Por conta disso, na segunda metade do século XX, os países viveram com medo de um possível holocausto nuclear.

Essa preocupação de uma guerra nuclear entre os rivais, Estados Unidos e União Soviética, juntou-se com a preocupação com a chamada proliferação nuclear. Isso era a possibilidade de outros países, e até organizações terroristas, conseguirem o controle da bomba.

Então, em 1953, o governo do presidente americano Dwight Einsenhower lançou a iniciativa “Átomos para a Paz” para tentar conter essa possibilidade. Ela prometia facilitar o acesso a usos pacíficos da energia nuclear para países que renunciassem a se equipar com a bomba.

Em 1957, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) foi criada. E em 1968, estabeleceu-se o Tratado de Não-Proliferação Nuclear para fazer frente a esse perigo.

Mesmo com essas iniciativas, elas não conseguiram impedir que em praticamente todas as regiões do mundo tivessem, pelo menos, um país que tenha desenvolvido armas nucleares.

Além dos Estados Unidos e da Rússia, outros países também têm bombas nucleares, como por exemplo, países da Europa (Reino Unido e França); da Ásia (China, Coreia do Norte, Índia e Paquistão); do Oriente Médio (Israel, que não admite formalmente ter a bomba) e da África (sendo a África do Sul o único país que desenvolveu a bomba e depois voluntariamente se desfez dela).

Isso prova que países de praticamente todas as partes do mundo têm ou tiveram armas nucleares. No entanto, existe uma exceção, a América Latina, que não tem nenhuma potência nuclear e também foi a primeira região densamente povoada do mundo a se declarar uma zona livre de armas nucleares.

E qual o motivo de isso ter acontecido? São varias as razões, mas as primeiras foram vistas há seis décadas.

Países sem armas nucleares

BBC

“A história de por que a América Latina não tem armas nucleares remonta à crise dos mísseis em outubro de 1962, quando a União Soviética posicionou mísseis em Cuba, dando origem a uma crise entre os Estados Unidos e a União Soviética. Como resultado, vários países da América Latina decidiram começar a formar uma resposta multilateral para evitar que outra crise de mísseis aconteça na região. Essa foi a primeira vez que países da América Latina viram riscos nucleares tão próximos de casa”, explicou Luis Rodríguez, pesquisador de pós-doutorado do Centro de Segurança e Cooperação Internacional da Universidade de Stanford, na Califórnia (EUA).

O pesquisador explica que, desde o fim da década de 1950, surgiu uma preocupação de impedir que outro país fizesse o que os Estados Unidos fizeram em Hiroshima e Nagasaki. Um dos países que promoveu essa ideia na Europa foi a Irlanda, e na América Latina foi a Costa Rica.

Na visão de Ryan Musto, da Faculdade de William e Mary, em Virgínia, EUA, a ideia de banir a bomba existia na América Latina desde antes de 1962. Mas ele pontua que depois tudo mudou.

“A Crise dos Mísseis de Cuba foi um catalisador, e o Brasil então propõe tornar a América Latina uma zona livre de armas nucleares como uma possível solução para essa crise, porque poderia facilitar a retirada de mísseis de Cuba, ao mesmo tempo em que permitia livrar a cara tanto dos Estados Unidos, como da União Soviética”, disse ele.

Por mais que essa ideia não tenha funcionado, vários países latino-americanos continuaram a ver a criação de uma zona livre de armas nucleares como uma maneira de evitar a volta de uma crise parecida no futuro.

Então, a região começou um processo de negociações que, em fevereiro de 1967, resultou na criação do Tratado de Tlatelolco. Ele proíbe o desenvolvimento, a aquisição, o teste e a instalação de armas nucleares na América Latina e no Caribe. O tratado entrou em vigor em 1969.

Resistência do Brasil e da Argentina

BBC

Mesmo que o Brasil tenha sido um dos países que incialmente propuseram a criação de uma zona latino-americana livre de armas nucleares, logo ele mudou sua posição a respeito desse assunto.

“Depois do golpe no Brasil em 1964, as elites militares do país decidiram investir menos no projeto de desmilitarização da América Latina”, disse Rodríguez.

Além do Brasil, outro país relevante, do ponto de vista da tecnologia nuclear, que se recusou a aceitar totalmente o tratado foi a Argentina.

“Depois de 1962, o México se torna a face visível dessa iniciativa. O Brasil se distancia dela. Há cientistas que questionavam internamente: ‘Queremos mesmo abrir mão do nosso direito de ter armas nucleares em troca de nada? O que acontecerá se um dia precisarmos delas?'”, disse Musto.

De acordo com o especialista, tanto Brasil como Argentina apoiaram formalmente o Tratado de Tlatelolco porque “pegaria mal” não apoiar. Além disso, esses países também participaram da elaboração do acordo tentando influenciar para que fosse permitido o que era conhecido como “explosões nucleares pacíficas”.

Segundo Rodríguez, naquela época, acreditava-se que a energia nuclear poderia ser um instrumento para acelerar o desenvolvimento dos países latino-americanos. E essas chamadas “explosões nucleares pacíficas” poderiam ser usadas para abrir minas, canais de navegação ou em obras de hidrelétricas.

“Foi isso que levou países como Brasil e Argentina a desenvolver certos programas nucleares de tecnologia de uso duplo, que poderiam servir ​​para fins civis ou militares, o que gerou certas tensões, principalmente com organizações internacionais”, explicou Rodríguez.

Tanto Rodríguez como Musto afirmam que não se comprovou que os governos dos dois países tinham planos de desenvolver armas nucleares, mesmo que existam indícios de que essa era a vontade de pessoas dentro dos governos.

“O que Brasil e Argentina fizeram foi criar um programa nuclear fora das regulamentações da Agência Internacional de Energia Atômica, por isso são chamados de programas secretos do Brasil e Argentina. Há historiadores como Carlos Pati, um italiano que trabalha no Brasil, que não constataram que as motivações foram puramente militares ou que foram para criar armas nucleares. O que se vê é que houve uma divisão nos dois países entre facções das elites que queriam armas nucleares e facções que decidiram não tê-las”, ressaltou Rodríguez.

Contudo, no começo da década de 1990, os dois países renunciaram ao direito às explosões nucleares pacíficas. Além disso, eles entraram totalmente no Tratado de Tlatelolco e, depois, também no Tratado de Não-Proliferação Nuclear.

Fonte: BBC

Imagens: BBC

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