Quem escuta falar sobre o filme Amores Canibais nem pensa que se trata de uma história de amor. De fato, é uma das mais bizarras do cinema, mas, curiosidade, tem a aprovação do grande diretor Quentin Tarantino.
As distopias continuam a fascinar a imaginação humana com suas representações intensas e inquietantes de um futuro em risco.
A cada nova fase, o cinema renova esse gênero, explorando diferentes aspectos dos medos e incertezas que envolvem a existência humana. Desde tempos remotos, a preocupação com a sobrevivência e o destino da humanidade tem sido um tema constante.
O indivíduo, frequentemente marginalizado e sufocado por um mundo impiedoso, luta para se entender e superar seus medos, enfrentando a sensação de impotência enquanto busca atender tanto às suas necessidades físicas quanto espirituais.
Esse caminho de autoconhecimento e resistência é essencial nas narrativas distópicas, expondo o constante conflito entre esperança e desespero.
É nessa linha que Amores Canibais caminha, traçando paralelos entre sentimento cru, entendimento de si e problemáticas que envolvem o outro.
Amores Canibais
“Amores Canibais”, dirigido pela cineasta iraniana-americana Ana Lily Amirpour, é um exemplo marcante de narrativa distópica. O filme explora o lado sombrio da natureza humana em um cenário pós-apocalíptico, carregado de desolação e caos.
Amirpour, famosa por seu estilo inovador e provocador, apresenta um mundo devastado pelo desespero e pela fome.
Sua habilidade em criar atmosferas de tensão e desolação já se evidenciou em “Garota Sombria Caminha pela Noite” (2014), onde uma jovem solitária, ao mesmo tempo vítima e predadora, encontra uma maneira cruel de lidar com sua existência, alimentando-se do sangue de suas vítimas.
Agora, em “Amores Canibais”, a trama se passa em um deserto texano, cuja aridez simboliza a decadência de um mundo em ruínas. A protagonista, Arlen, representa a luta entre a desesperança e a fé, navegando em um universo onde a sobrevivência se mistura à brutalidade.
Suki Waterhouse, que interpreta Arlen, transmite de forma convincente um sentimento de desconforto e inadequação, que evolui para repulsa e tédio ao longo da história.
Sua personagem enfrenta uma realidade brutal, marcada pela violência dos canibais que a mutilam, forçando-a a lidar com sua nova e aterradora condição.
Contrastes
Em contraste com o cenário desolador, destaca-se a figura de Miami Man, vivido por Jason Momoa, cuja atuação impressiona ao revelar a profundidade e a complexidade do personagem.
Miami Man é um imigrante cubano que, embora pareça fisicamente intacto, carrega cicatrizes emocionais profundas e perdas devastadoras. Sua presença no filme serve como um contraponto essencial, introduzindo um elemento de humanidade e redenção, refletido de maneira sutil no próprio título da obra.
A trilha sonora, assinada por Andrea von Foerster, complementa perfeitamente a atmosfera do filme, com uma seleção musical que evoca a estética apocalíptica dos anos 1980 e 1990.
A inclusão de artistas como Boy George e Ace of Base não só reforça a ambientação, como também contribui para o apelo nostálgico e atmosférico da narrativa.
“Amores Canibais” se apresenta, assim, como uma exploração rica e multifacetada da condição humana em um mundo em colapso.
Com uma narrativa carregada de tensão e complexidade emocional, o filme desafia o espectador a encarar as profundezas da desolação e da esperança, capturando a essência de uma luta primordial pela sobrevivência e pela identidade.
Para quem busca um título profundo, que faz pensar, essa é a indicação. No entanto, vale ter em mente que foge do convencional, e mesmo trazendo dois protagonistas e seu envolvimento amoroso, está longe de ser um romance de cinema.
Fonte: Revista Bula
Imagens: Netflix, Papo de Cinema