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Funk faz sucesso no exterior, mas ainda é atacado no Brasil

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Você está em uma boate lotada. As pessoas ao seu redor estão com copos nas mãos, se divertindo ao som do DJ, que você não conhece. Os corpos estão suados e a boate está lotada, mas ninguém se importa. A batida da música começa como qualquer uma que você espera ouvir em uma boate, mas ela lentamente se torna conhecida. Quando você se dá conta, um remix de Bum Bum Tam Tam faz o público enlouquecer. Essa cena parece ser uma tirada de uma boate brasileira, mas a verdade é que acontece ao redor do mundo há um bom tempo. O funk estourou, sem dúvidas, mas o Brasil ainda não o reconheceu.

Música e luta

O pesquisador Danilo Cymrot aponta que, apesar do sucesso estrondoso do funk, um gênero verdadeiramente brasileiro, ao redor do mundo e dentro do país, ele ainda enfrenta ataques e perseguição, inclusive da lei. Anitta, entre outros artistas responsáveis pelo sucesso do funk no exterior, não impede que o gênero sofra com a criminalização e a repressão policial.

“Acho que existe uma síndrome de vira-lata também, que não valoriza nossa produção”, disse em entrevista à BBC News Brasil. Danilo Cymrot é mestre e doutor em Direito Penal e Criminologia pela Faculdade de Direito. Dessa forma, desde 2013, ele integra à equipe do Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo.

No mês de junho, Cymrot lançou um livro sobre a história de criminalização do funk por meio de projetos dele que tentam disciplinar, proibir e censurar o gênero musical, intitulado O Funk na Batida (Ediçoes Sesc).

Na obra, ele descreve como o ritmo, que nasceu nas periferias do Rio de Janeiro e de São Paulo, passou a ser ligado à criminalidade e à violência. Como resultado, sofre perseguição tanto da mídia quanto de parlamentares, independente da inclinação política.

Assim, na entrevista, o autor também pontuou o histórico de estigmatização do funk ainda nos anos 1990, além do papel de parlamentares na criação de leis que dificultaram a realização dos bailes e o “funk proibidão”. Esse subgênero é aquele que carrega letras sobre a violência na periferia e facções criminosas.

Por outro lado, Cymrot ressaltou como os rolezinhos, como são chamados os encontros de jovens funkeiros em shopping centers de São Paulo, não só desagradaram parte da periferia, como também as duas partes do espectro político. Isso porque alguns consideraram a atitude como “vendida ao capitalismo” e outros como “fútil”, por conta do perfil de baixa renda dos integrantes.

Perseguição do funk

Rio Baile Funk

Vincent Rosenblatt

“Mesmo com sucesso no exterior, ele continua atacado e desvalorizado no Brasil. Claro que um cantor de proibidão não vai fazer o mesmo sucesso da Anitta. Os funkeiros sabem que precisam moldar o discurso para atingir determinados públicos”, disse o pesquisador.

“Veja o caso da música Deu Onda, do MC G15, que surgiu como um funk com linguagem explícita. Quando ela começou a fazer sucesso, ele mudou a letra para uma versão mais suave. Baile de Favela tocou na Olimpíada de Tóquio na apresentação da ginasta Rebecca Andrade, mas também foi uma música que teve sua versão original ‘adaptada’ para atingir outros públicos.”

“Acho que existe uma síndrome de vira-lata também, que não valoriza nossa produção. Alguns artistas, mesmo quando são valorizados no exterior, são atacados aqui. O sucesso não traz necessariamente o reconhecimento. Eles são acusados de terem traído suas origens, como a Carmem Miranda, ou porque ‘estão manchando’ a imagem do Brasil ao reforçar o ‘apelo sexual e vulgar dos brasileiros’, como a Anitta e outros artistas.”

Funk: além de um gênero

“Historicamente, a reunião de jovens negros sempre causou desconfiança e medo na elite brasileira. No século 19, havia regulamentos que proibiam a circulação de ajuntamentos de negros escravizados ou até libertos. Existia a suspeita de que as aglomerações poderiam ensejar revoltas. A capoeira foi criminalizada por isso.”

“Na República Velha, negros circulando pela cidade eram acusados de vadiagem. O samba não foi proibido, mas sambistas foram presos e acusados desse delito. Então, a criminalização se repete com manifestações culturais da população negra e periférica, não é uma novidade no Brasil.”

Rolezinhos e rolezeiros

Assim sendo, os rolezinhos, que tiveram um aumento em São Paulo em 2014, também refletem essa realidade. “Naquele momento, o shopping center tinha uma simbologia especial. Isso porque o Brasil vivia um bom momento econômico, o ápice da era do consumo. Parte da população ascendeu socialmente por meio do consumo. Isso se refletiu no funk ostentação.”

“São Paulo não tem praia e os jovens se organizaram pelas redes sociais para se encontrar nesses locais. É importante dizer que eles já frequentavam esses lugares, era parte do cotidiano deles. E não eram shoppings da elite, mas na periferia mesmo, como Itaquera e Aricanduva.”

“E não são só pessoas brancas e ricas têm hostilidade ao funk, mas também gente das próprias periferias, que convive com o barulho, com os bailes nas ruas, com letras consideradas imorais pela religião evangélica que é muito presente na periferia. Como eles faziam barulho, cantavam e se divertiam em grupo, essa aglomeração foi reprimida por seguranças e pela polícia.”

“Alguns pesquisadores tentaram relacioná-los às manifestações de junho de 2013. Elas foram organizadas pelas redes sociais por jovens que tinham demandas sobre mobilidade e direito à cidade, mas também havia diferenças. Embora não tivessem um discurso político explícito, os rolezinhos expressavam o direito de circular pela cidade, contra o assédio policial e contra o racismo.”

Dessa forma, os artistas que cantam e produzem funk lutam diariamente para conquistar mais espaço, sendo cada vez mais comum ouvir as músicas, seja em festas brasileiras, francesas, portuguesas, estadunidenses e mais.

Fonte: G1

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