Diversas aves terrestres, ao contrário do que se acreditava até pouco tempo, realizam voos de centenas ou até milhares de quilômetros sobre os oceanos como parte de suas rotas migratórias regulares.
Essa descoberta foi feita por pesquisadores do Instituto Max Planck de Comportamento Animal e da Universidade de Konstanz, na Alemanha, e foi publicada na revista científica Proceedings of the Royal Society.
A equipe revelou aspectos cruciais dos voos transoceânicos de algumas aves, que são capazes de cobrir grandes distâncias sem interrupções, levantando a questão de onde descansam durante seus trajetos em mar aberto.
O que são aves migratórias?
Aves migratórias são aquelas que realizam rotas sazonais de longa distância entre áreas de reprodução e áreas de alimentação ou descanso. Esses deslocamentos geralmente ocorrem em resposta a mudanças nas condições climáticas, disponibilidade de alimentos ou períodos de reprodução.
As migrações podem variar de algumas centenas a milhares de quilômetros, e as aves utilizam rotas fixas, conhecidas como corredores migratórios.
Algumas das aves mais famosas nessas rotas são as andorinhas, cegonhas, algumas famílias de águias e falcões, além de gansos. As rotas geralmente são entre América do Norte, Europa e África.
As aves migratórias utilizam uma combinação de pistas naturais, como o campo magnético da Terra, posição do sol e estrelas, além de marcos geográficos.
Muitas espécies seguem rotas de migração específicas que podem cruzar continentes, mares ou até mesmo oceanos.
No entanto, a migração exige muito das aves, e elas tendem a acumular reservas de gordura antes de iniciar o voo.
Como as aves terrestres cruzam o oceano?
Utilizando tecnologia de GPS, os cientistas monitoraram a migração global de cinco espécies de aves terrestres de grande porte, conhecidas por realizarem longas travessias sobre o oceano.
Entre essas espécies estão o açor (Pernis ptilorhynchus), o falcão-de-cara-cinzenta (Butastur indicus), a águia-pescadora (Pandion haliaetus), o falcão-peregrino (Falco peregrinus) e o falcão-de-eleonora (Falco eleonorae), que seguem uma rota aérea conectando a África à Eurásia.
Os dados coletados ao longo de nove anos, abrangendo 112 trajetos migratórios, foram comparados com as condições atmosféricas globais para compreender como essas aves se deslocam sobre o oceano.
Assim, as descobertas mostraram que essas aves terrestres aproveitam as correntes de vento e a elevação para reduzir o gasto de energia durante o voo, chegando a modificar sua rota em busca de condições atmosféricas mais favoráveis.
A pesquisa também levanta preocupações sobre o impacto das mudanças climáticas nas migrações das aves.
Nesse contexto, Elham Nourani, principal autor do estudo, destaca que o suporte atmosférico é essencial para que muitas aves terrestres concluam suas jornadas migratórias sobre os oceanos, tornando-as vulneráveis às mudanças nos padrões climáticos globais.
E onde os pássaros descansam?
Ao cruzarem oceanos tão grandes, os pássaros podem ter dificuldade em encontrar locais para descansar e comer.
Tradicionalmente, acreditava-se que aves migratórias utilizavam ilhas como pontos de descanso ao longo de suas jornadas. Porém, pesquisas recentes indicam que os pássaros também podem utilizar embarcações como locais de repouso.
Um estudo de 2022, liderado por Maurizio Sarà, zoólogo da Universidade de Palermo, revelou que aves terrestres frequentemente pousam em navios para descansar.
Durante um cruzeiro pelo Mediterrâneo em 2021, Sarà observou que, em média, três aves pousavam no barco diariamente. O tempo médio de permanência era de 42 minutos, embora algumas ficassem durante toda a noite.
Ampliando suas observações para os milhares de embarcações que navegam diariamente pelo Mediterrâneo e para os bilhões de aves que cruzam o mar durante suas migrações, Sarà estimou que até quatro milhões de pássaros podem fazer paradas em barcos durante seus voos em alto-mar.
Esse fenômeno, conhecido como “migração assistida por embarcações”, sugere que algo semelhante pode ocorrer em outros oceanos.
Adaptação
Globalmente, cerca de 4.000 espécies de aves migram, e muitas enfrentam ventos fortes ou tempestades enquanto percorrem milhares de quilômetros.
Ao passar pelos oceanos, essas aves passam longos períodos sem água ou alimento. Embora as ilhas sejam pontos tradicionais de descanso, os navios podem oferecer uma alternativa mais acessível para essas paradas essenciais.
As observações de Sarà e outros pesquisadores ressaltam a adaptabilidade e resiliência das aves migratórias. Além disso, destacam a necessidade de considerar o impacto humano no deslocamento desses animais.
Fonte: Concurso Brasil