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Escolas se arriscam e deixam alunos levarem merenda para familiares com fome

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O momento atual é de muita luta para milhões de pessoas ao redor do mundo. Nesse instante, inúmeras famílias passam fome, sem saber quando será a próxima refeição garantida.

“A gente faz o que não pode fazer: chama as crianças fora do horário e dá merenda para elas levarem para casa. Às vezes, a própria família vem aqui pedir comida, como uma mãe que me disse: ‘o desespero me fez perder a vergonha — estou com fome’.” Esse é o relato de uma diretora de uma escola pública de São Paulo.

Ela representa apenas um exemplo de profissionais da educação que arriscam burlar as regras para ajudar pais de alunos em situação de vulnerabilidade no Brasil.

Com isso, forma-se uma rede de apoio, incluindo merendeiras, professores, coordenadores e diretores pedagógicos, que detecta os casos de famílias que passam fome e precisam de mais ajuda. Depois, a equipe traça uma estratégia de auxílio.

“Se alguém da cozinha vê uma criança pegando muita fruta e escondendo na mochila, a gente já sabe o que está acontecendo. No fim do dia, chama os pais e dá um pouco de comida”, diz a profissional não identificada.

“Uma vez, um menino pegou tanta bolacha e guardou [na bolsa], que tivemos de chamá-lo na saída, discretamente. Explicamos que ele podia levar tudo para casa, mas que, quando precisasse, poderia pedir. Ele saiu pulando de alegria. Depois, montamos uma campanha de arrecadação”, conta.

Prática irregular

Vale destacar que o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é voltado à nutrição dos estudantes de forma exclusiva, o que significa que permitir que as merendas sejam consumidas pelas famílias é uma prática irregular.

Então, caso descoberta, a Secretaria de Educação pode ser responsabilizada pelos órgãos de controle por desviar recursos públicos para algo que não está previsto pelo PNAE.

“É claro que é complicado: os profissionais ouvem, em uma roda de conversa na sala de aula, que alguém está passando necessidade em casa, e aí querem resolver. Mas a merenda precisa ser consumida só pelos alunos matriculados, não existe autorização para os pais consumirem”, explica Marcia Simões, presidente do Conselho de Alimentação Escolar de São Paulo. “É uma verba que vem da Educação, para que as crianças se alimentem e tenham condição de aprender.”

Além disso, Gabriel Corrêa, gerente de políticas educacionais da ONG Todos Pela Educação, também ressalta que a distribuição de merenda para as famílias não é permitida. Porém, ele faz uma ressalva.

“É uma questão humanitária. Os educadores tentam achar uma solução temporária e imediata para apoiar as crianças. Quem trabalha na educação sabe: aluno não aprende nada de barriga vazia.”

Dessa forma, segundo Simões e Corrêa, o que deveria acontecer nesses casos de fome é uma articulação maior das redes de ensino com o setor de assistência social. Além disso, é necessário a ampla divulgação de um protocolo que os professores devem seguir quando percebem casos de insegurança alimentar.

Merenda é a refeição da família

merenda

Arquivo pessoal

Uma mãe de dois alunos de uma escola municipal conta que está desempregada e que sua única fonte de renda é o Auxílio Brasil (R$ 400). Claramente, não é o suficiente para alimentar a família.

Assim, ela relata: “A diretora de onde minha filha estuda é um anjo. Ela sabe quem está passando necessidade, e aí deixa a criança levar um pouco de merenda na mochila. Foi isso que me sustentou nos últimos dois meses. Graças a ela, tive almoço e jantar: mingau, canja, bolacha com suco.”

Desse modo, a mãe conta que sua prioridade é garantir comida para as crianças e evitar que elas abandonem a escola para trabalhar. “As pessoas veem meu menino como um Zé Ninguém. Ele chora e diz: ‘mamãe, um dia eu vou sair dessa vida’. Eu digo que sim, que é só estudar.”

Já uma professora de outro colégio público conta que “acaba sobrando alimento em dia sem aluno, como quando tem conselho de classe ou evento na escola”.

“Nessas datas, o colégio chama extraoficialmente os pais dos jovens mais carentes para distribuir feijão, ovos, verduras, frutas e, às vezes, carne. É tudo bem escondidão e por baixo dos panos, porque, se o governo desconfiar, a gestão escolar pode ser advertida”, relata.

Articulação

De acordo com Côrrea, do Todos Pela Educação: “O difícil é que o profissional não sabe o que fazer quando vê uma criança com fome. Isso não é culpa dele, e sim da gestão pública, que deve disseminar informações e criar protocolos de como agir nestes casos. Precisamos de mais diálogo. As ações para uma criança na sala de aula não podem ser apartadas das que existem na área da saúde ou da assistência social”.

“Quando há uma situação assim, é natural e bem-vindo que educadores e profissionais façam de tudo para apoiar crianças e famílias. Mas são ações emergenciais que não podem substituir o poder público”.

Fonte: G1

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