O autismo é um transtorno global do desenvolvimento e possui três características fundamentais: as pessoas que têm tal transtorno são incapazes de interagir socialmente, possuem um padrão de comportamento restrito e repetitivo e têm dificuldade com a linguagem comunicacional e interação de jogos simbólicos.
Esse problema se divide em algumas fases de comprometimento. Começa pela Síndrome de Asperger, que seria a mais leve, e não compromete a fala e nem inteligência, e vai até os casos mais graves, em que a pessoa não consegue manter contato interpessoal, sendo bastante agressiva e apresentando retardo mental.
O diagnóstico para autismo é essencialmente clínico e depende muito do comprometimento e histórico do paciente. Para as pessoas que vivem com autismo, algumas alterações sensoriais, como por exemplo, o incômodo extremo com determinados barulhos ou texturas, e um repertório específico de interesses, também conhecido como hiperfoco, costumam ser comuns.
“Os autistas têm uma maneira diferente de perceber o mundo. Isso faz com que eles voltem a atenção para outros elementos do ambiente que não são necessariamente os estímulos sociais. Em um ambiente cheio de gente, por exemplo, é possível que o barulho de um instrumento ou do motor de um carro na rua chame mais atenção do que a voz das pessoas”, explicou a psiquiatra Mirian Revers Biasão, professora da Escola Internacional de Desenvolvimento (EID).
Camuflagem social
A médica é pesquisadora do autismo e explica que a experiência de uma pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) tem como resultados aprendizados diferentes e também ações diferentes das que normalmente são esperadas socialmente entre as pessoas.
“Eu, por exemplo, aprendi a me comportar em determinado ambiente porque observei e alguém, como minha mãe, me ensinou. O que acontece com os autistas é que eles conseguem aprender como interpretar as ações de outras pessoas e entender o que é esperado deles, mas isso não acontece de forma tão natural”, pontuou ela.
É justamente esse processo de tentar imitar os comportamentos que são considerados socialmente aceitos, seja com os amigos da escola, no trabalho ou até mesmo em casa, que se chama de camuflagem social ou “masking”.
“Como não é tão natural para neuroatípicos, essas atitudes acabam gastando mais energia do cérebro e a pessoa pode ficar exausta, tanto fisicamente quanto emocionalmente”, ressaltou Biasão.
Problemas
Essa camuflagem social não é uma coisa boa para os autistas, como já mostraram várias pesquisas. Elas mostram que esse comportamento está relacionado com índices maiores de depressão, ansiedade e exaustão.
Uma dessas pesquisas foi publicada em 2017, e levantou a hipótese de que os homens autistas sofrem mais com esse efeito. Isso porque, as mulheres, normalmente, têm uma dificuldade menor em fazer essa camuflagem.
“Crises por sobrecargas sensoriais também podem contribuir para esses quadros, por isso o diagnóstico é tão importante. A partir do momento que sabemos que alguém é autista, podemos começar a trabalhar os limites com esse paciente. Em vez de passar quatro horas em uma festa, por exemplo, pode ser mais confortável para essa pessoa ficar apenas duas horas”, afirmou Biasão.
Meninas
Dentre as pessoas, a ciência tem a teoria de que existe uma diferença entre o cérebro dos homens e o das mulheres. Nesse ponto, alguns estudos mostram que o cérebro feminino é um pouco mais desenvolvido nas áreas correspondentes ao comportamento social.
Como resultado, as ações mais estereotipadas, como as mostradas em séries com protagonistas autistas, como “Atypical”, não são tão predominantes em mulheres com autismo.
“Isso dificulta inclusive que as meninas sejam diagnosticadas”, disse Joana Portolese, coordenadora do Programa de Transtornos do Espectro Autista do IPq (Instituto de Psiquiatria), do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Um outro ponto levantado por Portolese é que o medo de cometer “erros sociais” é maior nas meninas e mulheres. Por conta disso, o hiperfoco tende a se voltar para interesses que não destoam tanto daqueles apresentados por colegas da mesma idade.
Então, se a menina não é diagnosticada na infância, é possível que a mulher cresça e fique melhor em disfarçar os seus sinais de autismo. Consequentemente, seu diagnóstico será atrasado em anos.
“Uma vez ouvi a Temple Grandin, psicóloga autista, dizer que a ideia de ser autista é que você gradualmente fica cada vez menos autista, porque você continua aprendendo como se comportar. Ela fala que é como atuar em uma peça de teatro”, concluiu Portolese.
Fonte: BBC
Imagens: Pebmed, Jade autism, BBC
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