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O impeachment que julgou um papa morto

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No início deste mês, Donald Trump, o ex-presidente dos Estados Unidos, passou a ser julgado pelo Senado. A medida veio logo depois que Trump sofreu seu segundo impeachment. As acusações, em ambos impeachments, são as mesas: “crimes graves e contravenções”. Conforme expõe uma recente reportagem publicada pela BBC, Trump “é acusado de incitar à insurreição antes de seus apoiadores atacarem o prédio do Capitólio, nos EUA, em 6 de janeiro”.

Para Lindsey Graham, senadora republicana, se Trump for condenado pelo Senado, ainda mais após deixar o cargo, a situação torna aptos os ex-presidentes a irem a julgamento. “Se um presidente pode ser julgado depois de deixar o cargo, por que não julgamos George Washington? Ele possuía escravos”, disse Graham. “Onde isso vai parar?”

A afirmação da senadora, mesmo carregando um certo teor de justiça, há, em si, uma falha óbvia: aqueles que estão mortos, não podem se defender. Pensando nisso, a BBC produziu uma incrível reportagem, mostrando como a história do papado medieval jamais colocou a morte como um obstáculo em casos de acusação por má conduta de pessoas, que assumiram importantes cargos públicos.

O impeachment medieval

Para entender melhor o conteúdo divulgado pela BBC, é preciso, antes de mais nada, voltar ao passado, especificamente em um momento em que a Igreja ocidental vivenciou uma forte crise, a qual havia se instaurado por conta de disputa acirrada entre Roma e Constantinopla para determinar quem assumiria o poder da igreja cristã. Obviamente, essa disputa de poder promoveu uma série de tensões entre Constantinopla e Roma.

Os problemas que, em um determinado momento, muitos pensaram que poderiam chegar ao fim com uma simples conversa, se intensificaram com a chegada de imigrantes na atual Hungria e Bulgária, afinal, ambas nações, que seguiram fielmente a maré guiada pela Igreja ocidental, disputavam a soberania sobre uma população que, por ser nova, passava “por mudanças e com lealdades variadas”.

Como os conflitos não cessaram, questões importantes sobre os líderes da cristandade passaram a ser questionadas. Para tentar controlar mais a autoridade daqueles que assumiam posições de poder, durante este período, o equivalente medieval do impeachment passou a ser colocado em pauta com bastante frequência. Foi, de acordo com a reportagem da BBC, “um sínodo eclesiástico realizado em Roma, no qual o titular do mais alto cargo da cristandade poderia ser julgado por transgressões às tradições e costumes de seu cargo”.

De todos os sínodos que ilustraram este período em questão, o mais peculiar aconteceu em janeiro de 897. À data, julgaram o então pontífice Formoso, que havia sido papa entre 891 e 896. O detalhe que torna o sínodo peculiar é o fato de que Formoso já estava morto há sete meses quando foi exposto a julgamento, o que, para o novo papa, Estevão 6º, não fazia diferença, pois para ele, independentemente de um líder deixar o cargo, o mesmo deveria ser punido por suas atitudes.

Morto e sentado no trono

É importante lembrar que, nessa época, o papado mudava em um ritmo alarmante. Segundo a BBC, “quase todos os anos entre 896 e 904 havia um novo papa, às vezes até dois”. A mudança era apenas um reflexo de uma acirrada disputa de poder e o impeachment de Formoso retrata bem isso, até porque o papa Estevão 6º havia sido um de seus grandes apoiadores, mas, ao mudar de lado, alinha-se com a família Spoleto, todo-poderosa em Roma e, para provar lealdade, decide realizar o sínodo de Formoso.

Para realizar o sínodo, o papa Estevão 6º removeu o corpo de Formoso de seu sarcófago e o levou até à Basílica de São João de Latrão, em Roma, onde seria julgado. Não obstante, sob o comando do papa, o corpo de Formoso, que havia sido adornado com adereços papais, foi colocado em um trono. Como estava morto, um diácono foi selecionado pela Igreja ocidental para responder em nome de Formoso.

Estevão 6º acusou Formoso por inúmeros feitos, que vão desde quebrar juramento a ter obtido ilegalmente o título de papa. Condenado como culpado, as vestes papais foram arrancadas do cadáver de Formoso e os três dedos de sua mão direita que usara nas consagrações foram cortados. Depois disso, o cadáver foi enterrado em um cemitério destinado a indigentes. Depois de alguns dias, foi retirado do local e jogado no rio Tibre.

De acordo com a BBC, “após a morte de Estêvão 6º, Formoso foi reabilitado e seu papado restaurado pela Igreja”.

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