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Por que pais são elogiados e mães são repreendidas quando aparecem com filhos no trabalho?

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Nos últimos tempos, chamou a atenção dois casos envolvendo advogados que precisaram levar os filhos pequenos para sessões jurídicas. No entanto, enquanto o caso do pai foi antecipado, a mãe foi repreendida pelo desembargador.

Em entrevista ao G1, a professora de filosofia Patricia Ketzer disse que as situações envolvem questões de gênero.

“Quantas vezes a gente vê homem elogiado por fazer o mínimo, trocar a fralda, levantar para dar mamá para o filho à noite, sair para passear com o filho. São coisas que as mulheres fazem e são invisíveis [quando elas fazem]”, afirmou.

Já a vice-presidente da Comissão de Gênero da OAB em Chapecó, no Oeste de Santa Catarina, a advogada Vivian Ayumi, apontou que a atitude do magistrado, que repreendeu a mãe com a criança, violou o Estatuto da Advocacia.

“O desembargador, além de violar esse direito dessa advogada, ele está ferindo essa prerrogativa dela.”

Casos semelhantes, desfechos diferentes

Foto: Reprodução/ TV Globo

Em Brasília, o caso do advogado Felipe Cavallazzi foi antecipado no STJ na quinta-feira (18). Ele precisou levar o filho Lorenzo e a presença da criança  chamou a atenção dos juízes da Segunda Turma do STJ que, pelo menino ser entendido como prioridade, anteciparam o caso do advogado na lista de assuntos do dia.

A outra situação aconteceu no Tribunal de Justiça do Amazonas na última segunda-feira (22/08). Malu Borges Nunes foi repreendida pelo presidente da 2ª Câmara Cível do TJ-AM por estar com a filha, uma bebê de 6 meses, durante uma sessão plenária feita através de videoconferência.

De acordo com o G1, o desembargador Elci Simões paralisou a sessão por alguns segundos para repreender a advogada, dizendo que o barulho da criança estava atrapalhando a concentração da sessão.

Depois da repercussão das falas do magistrado, a advogada disse que se sentiu ofendida.

“Eu me senti primeiro ofendida como mulher, como mãe, como advogada também. Ele [desembargador] questionou a minha ética profissional em relação a eu estar, não sei, com ela no colo, ou amamentando, ou de estar no home office e ela estar perto de mim. Eu fiquei muito mal, chorei bastante depois. Eu me viro aqui nos 30 para dar conta de tudo que eu tenho que fazer. Dar conta de bebê, casa, trabalho”, disse em entrevista à TV Globo.

Questão de gênero envolvendo cuidar dos filhos

Foto: Reprodução/ Twitter/ Terra

A professora Patricia Ketzer, da Universidade de Passo Fundo (UPF), disse que os dois advogados serem tratados de forma diferenciada é uma questão de gênero.

“Pode pegar o exemplo de uma mãe solo. Ainda tem pessoas que têm visão conservadora quando veem uma mulher sem um marido, enquanto um pai solo é visto como um herói, como um homem que não abandonou o seu filho.”

Ketzer também apontou que muitas mães criam os filhos, chefiam os lares, dão conta do sustento da casa sozinhas. No entanto, quando disser que precisa sair mais cedo para cuidar do filho doente, afirmam que não se empregam mulheres.

“Quando um homem faz isso [sair do trabalho para tratar do filho doente], ele é louvado, é parabenizado, quando um homem faz o mínimo que uma mulher faz cotidianamente. Considera-se que não é papel dele [cuidar dos filhos], o homem é totalmente liberado desse trabalho”, acrescentou.

A advogada Liane Slaviero, que tem livros nas áreas de processo civil e direito e feminismo, complementa que essa tarefa não é esperada dos homens.

“Quando adentramos em espaços públicos cuidando da prole estamos invertendo a lógica e toda a estrutura de uma suposta igualdade é coloca em prova. Quando os homens exercem a paternidade cuidando do seu próprio filho em uma sessão de audiência – tarefa que não lhes compete originariamente na divisão sexual do trabalho – ela será notada, respeitada e até honrada publicamente, porque existe esta suposta inversão de papéis.”

O que diz a lei sobre advogados com filhos pequenos?

A Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Santa Catarina afirmou que as normas relativas às mães e pais advogados estão no Estatuto da Advocacia, lei número 8.906/1994. Uma segunda lei,  de número 13.363/2016 altera o estatuto para estipular direitos e garantias para a advogada gestante, lactante, adotante ou que der à luz e para o advogado que se tornar pai.

Com a alteração mais recente, o Estatuto da Advocacia diz, no artigo 7-A, inciso III, que são diretos da advogada “gestante, lactante, adotante ou que der à luz, preferência na ordem das sustentações orais e das audiências a serem realizadas a cada dia”.

O parágrafo primeiro deste mesmo estatuto afirma que os direitos previstos aplicam-se enquanto durar o período de amamentação

O artigo 7-B aponta que “constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado” e prevê uma pena de dois a quatro anos de detenção e multa.

Já a vice-presidente da Comissão de Gênero da OAB em Chapecó criticou a atitude do desembargador de repreender a mãe com a filha.

“Sem a figura daquela advogada, aquilo tudo que estava acontecendo não poderia acontecer. Ela não estava ali brincando. Certamente ela estava dispondo do tempo como provedora daquele lar para fazer aquele julgamento, aquela sessão acontecer. Quando a gente tem um desembargador falando, pedindo até a ética dessa nobre colega, a gente vê que ele também está infringindo todo esse estatuto [da Advocacia]”, afirmou.

O que diz o desembargador

Foto: Raphael Alves/ TJAM

Logo depois da repercussão do caso, o desembargador alegou, por meio de nota, que pediu “educadamente” para que a magistrada evitasse barulhos durante a sessão, em respeito aos outros profissionais.

“Recomendou-se educadamente e com todo o cuidado evitar barulhos durante a sessão, ainda mais em respeito a presença de outros advogados em audiência pública complexa e extensa”, afirmou.

Em relação ao pedido da advogada para falar primeiro durante a sessão, Simões disse que foi decidido que ela não precisava ser ouvida antes dos demais pois estava em home office.

Fonte: G1

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