Curiosidades

O lado ruim das pessoas com autocontrole

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Um jogo experimental feito com 80 pessoas na França apontou que os participantes que tinham registrado os índices mais altos de conscienciosidade (um traço de personalidade associado a pessoas cuidadosas, diligentes, com autocontrole e de comportamento moral) eram os que estavam mais dispostos a punir os outros competidores com choques elétricos para cada resposta errada.

O jogo parecia ser um programa-piloto de TV chamado La Zone Xtrême, a Zona Extrema em tradução livre.

“Pessoas acostumadas a serem organizadas e dóceis, com boa integração social, têm mais dificuldade em desobedecer”, disse à BBC Laurent Bègue, psicólogo e pesquisador da Universidade de Grenoble-Alpes, que analisou o comportamento dos participantes.

Essa descoberta se junta a outros estudos que apontam que pessoas com alto autocontrole e disciplina têm um lado sombrio. Isso pode ajudar a entender porque cidadãos exemplares às vezes se tornam tóxicos e têm comportamentos antiéticos.

Superando impulsos

Foto: Freepik

Durante muito tempo, o autocontrole foi apontado como algo exclusivamente positivo e vantajoso. Para muitos, pessoas com essa característica apontam um melhor desempenho na escola e no trabalho. Elas também adotariam estilos de vida mais saudáveis, pois eram menos propensas a comer demais ou a usar drogas.

Já as pesquisas apontavam que a capacidade de conter impulsos mais básicos também significava que elas tinham mais autocontrole e menos chance de agir de maneira agressiva ou criminosa.

Dessa forma, durante muitos anos se acreditou que o autocontrole ajudava a fortalecer o caráter da pessoa.

No entanto, na década de 2010, Liad Uziel, da Universidade Bar-Ilan, de Israel, começou a investigar a importância do contexto nas nossas decisões de autocontrole. Uziel utilizou como hipótese que o autocontrole é apenas uma ferramenta para atingir objetivos, e que estes podem ser bons e ruins.

Em diversas situações, nossas normas sociais recompensam as pessoas que cooperam com outras, algo que as pessoas com alto autocontrole se sentem confortáveis. No entanto, se essas relações sociais são mudadas, essas pessoas podem agir de forma diferente nas suas relações, de acordo com a teoria do pesquisador.

Jogo do ditador

Foto: iStock

Para testar a hipótese, Uziel utilizou um experimento psicológico chamado “jogo do ditador”. Nele, o participante recebe uma quantia em dinheiro e tem a oportunidade de compartilhá-la com um parceiro. Por causa das normas sociais de cooperação, as pessoas costumam ser generosas.

No entanto, os pesquisadores também descobriram que as pessoas com alto autocontrole só eram generosas após terem o receio de serem vistas publicamente como mesquinhas. Caso as suas ações fossem mantidas no sigilo, eram mais egoístas do que as pessoas de baixo autocontrole.

Dessa forma, quando o julgamento dos outros desapareceu, os de alto autocontrole optaram por privilegiar seus próprios interesses em vez de ajudar ao próximo. 

Já na Universidade de Western Illinois, nos EUA, David Lane e seus colegas descobriram que pessoas com alto autocontrole tinham maior probabilidade de escapar de penas por dirigir perigosamente e trapacear em testes, em comparação às que possuem baixo autocontrole.

Estudo de Denson

Foto: iStock

Dependendo do contexto, uma forte força de vontade pode contribuir também para atos de crueldade. Em um estudo de Thomas Denson, psicólogo da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália, foi percebido que os efeitos do autocontrole dependiam do senso de responsabilidade moral das pessoas.

De acordo com o estudo, as pessoas particularmente preocupadas com as consequências éticas de suas ações, o alto grau de autocontrole acabou fazendo pouca diferença na hora de “matar” os insetos e eles mataram um número moderado de insetos. No entanto, para um maior autocontrole aumentou significativamente o número de insetos que eles estavam dispostos a matar.

Porém, o que os participantes não sabiam era que o moedor de café utilizado no experimento foi construído para permitir que os insetos escapassem antes de serem mortos, já que o moedor ainda emitia um som de trituração conforme os insetos passavam pela máquina.

O segundo grupo parecia mais disposto a atender ao pedido dos cientistas e tinha maior capacidade de superar qualquer sentimento de aversão à tarefa.

Já o jogo francês descobriu que os participantes estavam dispostos a descarregar cerca de 100 volts a mais em seus colegas. De acordo com Bègue, que analisou o comportamento dos participantes, eles “queriam ser pessoas confiáveis e manter seu compromisso” com a tarefa dada.

No entanto, Laurent Bègue aponta que a sua pesquisa precisa ser replicada antes de tirarmos conclusões mais genéricas sobre a natureza humana.

Fonte: BBC

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