Na internet, os debates sobre tsunamis e terremotos no Brasil sempre se tornam acalorados. Mesmo que alguns duvidem, um tsunami já atingiu o território brasileiro e fez estragos na região do Nordeste. O episódio natural aconteceu em 1755 e foi impulsionado por um fenômeno europeu: um terremoto que sacudiu Lisboa, o mais forte já registrado no continente até hoje, segundo pesquisadores.
A região afetada pelo tsunami foi a que compreende o litoral do Nordeste. Em 2020, o fenômeno ocorrido no Brasil completou 265 anos. Na ocasião, a Rede Sismográfica Brasileira divulgou um vídeo no Twitter sobre o assunto, abordado pelo professor e ex-chefe do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília, José Alberto Vivas Veloso.
“Ele penetrou terra adentro, destruiu habitações modestas e desapareceu com duas pessoas”, disse Veloso. “Isso é desconhecido da maioria dos brasileiros”, completou o professor. Segundo Veloso, o terremoto de 1755 teve magnitude de 8,7, destruindo Lisboa, além de grande parte do sul da Espanha e do Marrocos.
As consequências do terremoto não atingiram só o Brasil. A Irlanda e as ilhas do Caribe foram atingidas por um enorme tsunami (bem maior do que aquele que atingiu o território brasileiro), cujo número de vítimas é difícil de precisar pela carência de registros. As menores estimativas estão entre 20 mil e 30 mil óbitos, enquanto as maiores falam em 100 mil.
Relatos do tsunami
Um trabalho liderado pelo professor Francisco Dourado do Centro de Pesquisas e Estudos sobre Desastres (Cepedes), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), reuniu cartas que testemunharam o ocorrido. Os relatos foram descobertos com base em um levantamento realizado pelo professor Veloso, que é autor do livro “Tremeu a Europa e o Brasil também”.
As correspondências, que estão no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa, foram escritas pelo arcebispo da Bahia, pelos governadores de Pernambuco e da Paraíba e por um militar brasileiro. “As águas transcenderam os seus limites e fizeram fugir os habitantes das praias”, diz uma carta datada de 10 de maio de 1756, relatando o episódio acontecido no ano anterior nas praias da Paraíba.
Em outra, de 4 de março de 1756, o emitente diz: “Em Lucena e Tamandaré, a enchente do terremoto entrou pela terra adentro coisa de uma légua (4 a 5 km) e levou algumas casas de palhoça e falta um rapaz e uma mulher”. Esse registro indica, justamente, o desaparecimento das duas pessoas apontadas por Veloso.
Segundo a pesquisa da UERJ, na região da praia de Lucena, na Paraíba, as ondas variaram entre 1,8 e 1,7 metros de altura. Já na região pernambucana de Tamandaré, as ondas atingiram de 1,9 a 1,8 metros, com grande volume de água. Para os moradores das localidades apontadas, que jamais haviam visto um fenômeno como esse em terras brasileiras, a situação foi assustadora a ponto de afugentar aqueles que estavam no litoral.
Outros registros de tsunamis no Brasil
De acordo com Veloso, cinco episódios históricos são denominados “manifestações marinhas incomuns” no litoral brasileiro: em São Vicente (São Paulo) em 1541, em Salvador (Bahia) em 1666, em Cananéia (São Paulo) em 1789, na Baía de Todos os Santos (Bahia) em 1919, e no Arquipélago de São Pedro e São Paulo (Pernambuco) em 2006.
Em todos esses casos, o mar estaria extremamente violento ou havia ressaca forte. No entanto, três desses fenômenos não foram precedidos por nenhum tipo de abalo sísmico ou erupção vulcânica, o que descaracteriza a ocorrência como um tsunami. Apenas os episódios de Cananéia e da Baía de Todos os Santos tiveram sua origem em terremotos, embora tenham apresentado magnitudes relativamente baixas.
Como o caso de 1755 foi em decorrência de um terremoto, ele pode ser classificado como tsunami. No entanto, Veloso afirmou que um grande tsunami (como os que ocorrem no Japão) estão fora de cogitação no Brasil. Um alívio, não é mesmo?
Fonte: Olhar Digital
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